sábado, janeiro 21, 2006

Uma questão de limpeza e não só

Estive ontem a ver um programa de televisão em que quatro homens conversavam a partir do mote "mulheres à presidência". Falaram de muitas coisas, sem que necessariamente percebessem do que estavam a falar, mas não é isso que quero agora abordar.
A dada altura, quando constatavam que as estruturas da sociedade não eram favoráveis a que as mulheres estivessem disponíveis para participarem na vida política ou noutros processos de tomada de decisão, um tal de Pedro Vasconcelos (passo a ignorância, pois nunca ouvi falar dele), que por acaso me pareceu que fazia parte da metade dos intervenientes com um cérebro a funcionar, disse que em Portugal se arruma muito, que se faz muito a cama, enfim, deu a entender que as mulheres passam demasiado tempo ocupadas com tarefas domésticas, o que não as liberta para participarem noutras actividades. E isto por comparação às mulheres de outros países (da Europa) onde se verifica uma maior participação feminina na política.
Não sei até que ponto este Pedro Vasconcelos tem consciência daquilo que disse, mas posso afirmar que é tão verdade quanto eu estar aqui sentada a escrever.
Fui educada num ambiente limpo e arrumado e aprendi que, dado que "sabemos como saímos de casa e não sabemos como entramos" (frase da minha sábia Tia), nunca se deve sair de casa sem fazer a cama. Não obstante ter várias vezes protestado por ser "obrigada" a ter as minhas coisas em ordem, habituei-me a gostar de ter sempre tudo arrumado e limpo, a deixar a banheira em condições para a pessoa que vem tomar banho a seguir, a vestir roupa passada a ferro, a não deixar a louça suja na cozinha de um dia para o outro, enfim, coisas básicas (para mim).
Por outro lado, todos nós sabemos como fomos habituados a comer. Todos os dias. A todas as refeições. Comida devidamente confeccionada. E sabemos também o trabalho que dá estar em condições de nos proporcionarmos esse tipo de alimentação diariamente, sem ter que gastar fortunas em restaurantes: temos de ir ao mercado ou ao super-mercado, planear com alguma antecedência as refeições e confecccioná-las. Pois também eu, à semelhança de muitas mulheres, encarrego-me dessa árdua tarefa.
Tendo embora contratado uma pessoa para me ajudar a limpar a casa e a passar a ferro, as outras tarefas de casa mantêm-me bastante ocupada, o que não me permite ter o tempo que eu queria para fazer coisas de que gosto – não para me dedicar à política, porque para isso não tenho jeito nenhum. Creio que isto acontece a muitas mulheres que, como eu, foram educadas “à antiga portuguesa”.
Quando tenho oportunidade de me comparar com as mulheres de outras nacionalidades que conheço, percebo porque é que a Finlândia tem uma mulher na presidência da República, porque é que a Hillary Clinton vai ser a próxima presidente dos EUA, porque é que a Alemanha tem uma chanceler... Encontro as explicações esporadicamente, ao nível local, quando sei que...
... uma irlandesa minha conhecida me diz que me admira por todos os dias ter coragem de cozinhar o jantar, uma vez que ela e a família (filha de três anos incluída) só comem uma refeição cozinhada por dia, que é o almoço...
... o jantar dos filhos dos meus vizinhos belgas são duas fatias de panrico com queijo ou fiambre...
... uma finlandesa que sai de casa para passar fora o fim de semana faz a “mala” arrebanhando indiscriminadamente roupa suja e lavada para dentro de um saco de plástico...
... uma belga vai trabalhar três dias seguidos com a mesma roupa...
... uma inglesa entra na minha cozinha, arregala muito os olhos e me pergunta Tu tens sempre a cozinha assim ou acabaste de fazer uma grande limpeza?...

20 Comments:

Blogger t-shelf said...

oh meu deus... também vi o debate e o rogério samora conseguiu irritar-me verdadeiramente com as suas birrinhas. Na verdade concordo contigo que o único cérebro mais produtivo do programa é o desse tal sr. Pedro Vansconcelos. E shame on me que desde que engravidei comecei já a preparar-me psicologicamente para o caos que aí virá, já não me dá tanta urticária lavar a louça do jantar na manhã seguinte e já não posso concorrer ao lugar de casa mais limpa do prédio, mas, justiça me seja feita, não tenho ajuda (só do maridito lindo) nem máquina de lavar louça, o que dificulta grandemente as coisas. Estou a poupar-me pois na casa nova vai haver muito que limpar... será que estou a tornar-me mais europeia? Eu diria preguiçosa mesmo mas enfim...

janeiro 21, 2006 2:34 da tarde  
Blogger Carlota said...

Oh! Viste?... Catita! Assim pelo menos sabes bem do que eu estava a falar.
É verdade, aquele Rogério Samora é uma verdadeira "loura" no masculino. E disfarça estupidamente mal para quem é actor...
O outro da SIC Notícias também não me pareceu lá grande espingarda, mas já o que conduz a conversa vê-se que pelo menos se prepara bem (isto só com base no programa de ontem, que foi o primeiro que vi).
Quanto ao assunto propriamente dito, querida T-Shelf, aconselho-te a arranjar rapidamente uma empregada. É que depois da chegada do terceiro membro da família vais ter ainda menos tempo/vontade para tratar da tua casota...
Beijola

janeiro 21, 2006 3:15 da tarde  
Blogger Xixao said...

Sou mulher, sou portuguesa, mas essa descrição não me assente. Talvez por trabalhar em Espanha já tenha aprendido alguma coisa. Como essa, por, ex de que 2 refeicoes quentes e diferentes por dia é excusado. Um iogurte com fruta, ao jantar, faz lindamente á saude e é muito saudável. A vida não é só cozinhar e limpar...
Agora confesso... roupa bem passadinha e lavadinha gosto!

janeiro 21, 2006 3:57 da tarde  
Blogger Pitucha said...

Carlota
Fiquei cansada só de ler o post!
Confesso que estou a anos luz de ti, mas tu sabes disso...
:-)

janeiro 21, 2006 9:58 da tarde  
Blogger deep said...

Concordo plenamente com tudo o que dizes! O trabalho de casa é extremamente penalizante, sobretudo para as mulheres. Os homens, quando o fazem, só "ajudam", não "cooperam", não "repartem" tarefas e sentem sempre que as mulheres ainda têm que lhes agradecer.
Bom fim-de-semana! Bjs

janeiro 22, 2006 12:20 da manhã  
Blogger Folha de Chá said...

Gostei tanto de te ler. :) A minha mãe é assim como tu, esfalfa-se. Agora que vive só com a minha avó. lá conseguiu diminuir o trabalho. E eu trouxe resquícios desses comigo. Gosto da cozinha a brilhar e o quarto de banho também. Se possível, cozinho duas refeições, embora faça sopa e arroz a mais de uma refeição para a outra, para diminuir o trabalho. Mas vou-me desleixando mais no pó e afins. Na ropa, também não. Concordo contigo. Com tantas tarefas destas, como é que temos tempo para nos aventurarmos noutra áreas? E viva o desleixo. Q.B. :)

janeiro 22, 2006 1:56 da manhã  
Blogger sabine said...

Tocaste no ponto essencial!
A minha mãe também tem a mania das limpezas, eu sou mais desleixada. Às vezes gostava de ser como ela.
Mas, depois de ler este texto, começo a ver as vantagens de ser como sou. ;)

janeiro 22, 2006 12:25 da tarde  
Blogger Carlota said...

MCM: Pronto, já percebi! Espanholaram-te!:)

Pitucha: Já tens núvem!:)

Deep: Pois! Já o contrário não acontece, ou seja, a nós ninguém nos agradece.

Folha de Chá: Obrigada por teres gostado. Confesso que haveria coisas com as quais me desleixaria se tivesse que ser eu a fazê-las. Limpar o pó seria uma delas.

Sabine: Olá! Bem vinda! Com tantos blogs, não te sobra com certeza muito tempo para a faxina.;)
Volta sempre!

janeiro 22, 2006 6:32 da tarde  
Blogger sabine said...

:)
Visita também:
http://insustentaveleveza.blogspot.com/

janeiro 22, 2006 6:59 da tarde  
Blogger Nancy Brown said...

tb eu pertenço a esse quadro e identifico-me bem mais com ele. contudo as futuras mulheres portuguesas serão um pouco como as finlandesas, belgas, etc. é uma questão geracional.

janeiro 22, 2006 7:04 da tarde  
Blogger Carlota said...

Olá Nancy! Bem vinda ao Lote 5!
Também estou de acordo contigo. Mas espero que as portuguesas se mantenham portuguesas no que respeita ao cheirinho a sabonete...
:)

janeiro 22, 2006 9:21 da tarde  
Blogger Sílvia said...

Boa abordagem Carlota. Isso era capaz de dar uma bela tese. ;o)

janeiro 22, 2006 10:42 da tarde  
Blogger Carlota said...

Bem vinda Silvia!
Vou pensar nessa hipótese. ;)
Até breve!

janeiro 22, 2006 11:45 da tarde  
Blogger K'os said...

Tive de rir ao ler o texto(desculpa mas é a verdade), não só por ser verdade, como pela maneira como está escrito. :)
Também fui assim educada, gosto de manter algumas delas, outras vou atenuando e limando de acordo com o tempo , situações.

janeiro 23, 2006 12:11 da manhã  
Blogger Carlota said...

Um outro olhar: Não tens de pedir desculpa! Se te riste, fica a saber que fico super-contente porque a ideia era mesmo fazer rir.

Ana: Tento aprender uns bocadinhos em algumas coisas porque não pretendo ter o monopólio da sabedoria, mas confesso que há hábitos de que não quero nem saber!

Beijolas

janeiro 23, 2006 10:49 da manhã  
Blogger Carlota said...

JVC, só tem paciência para cozinhar quem não tem a obrigação de o fazer, não é?

Beijola

janeiro 23, 2006 11:37 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

Viva o povo finlandês! Olha o que se poupa em água e electricidade! Leva-se a roupa suja para o chalet dos amiguinhos e diz-se: Ai esta semana não tive tempo para nada, posso lavar aqui estas camisolinhas e fico já despachada?

janeiro 23, 2006 11:41 da manhã  
Blogger Carlota said...

Margot, ficarias espantada se te dissesse que isso é absolutamente passível de ocorrer?
Beijola

janeiro 23, 2006 12:15 da tarde  
Blogger Carlota said...

Margot, ficarias espantada se te dissesse que isso é absolutamente passível de ocorrer?
Beijola

janeiro 23, 2006 12:15 da tarde  
Blogger Carla Motah said...

Como eu te compreendo. Não é que eu seja paranóica por limpezas. Nunca fui. Mas, lá está, não consigo sair de casa, seja a que horas for, sem fazer a cama, nem deixar a mesa posta, nem a loiça por lavar para o dia seguinte. Com ou sem máquina, há o mínimo. Quanto à ajudinha, pois tenho a minha romena que só vem uma vez por semana e é muuuito mole, mas lá vai fazendo. Enfim, com o filhote a caminho a coisa vai complicar e, se calhar, tenho de fechar os olhos a muita coisa se quiser ter os meus sagrados fins-de-semana. É que os maridos ajudam, mas quando se tem um que só chega a casa a partir das 8.30/9 da noite é difícil contar muito com o dito.
Mulher sofre...
Beijinhos

janeiro 25, 2006 8:08 da tarde  

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