O vão betão
Em 1986, um jornalista belga chamado Jean-Claude Defossé fez uma reportagem para o telejornal de um canal de televisão belga, chamando a atenção para o facto de ter sido construído no país um aqueduto de algumas dezenas de quilómetros, ligando Genk a Antuérpia, que tendo embora custado aos cofres do Estado a módica quantia de sete mil milhões de francos belgas (175 milhões de euros ou 35 milhões de contos), nunca tinha sido posto em serviço.
Após o sucesso desta reportagem, o jornalista iniciou uma série de outras reportagens todas subordinadas ao tema “As grandes obras inúteis” (tradução minha), que culminaram numa reportagem final denominada com o trocadilho «Les bâtisseurs d'ans pires» (“os construtores dos anos maus” e também, se apenas falado, “os construtores de impérios”).
Porque desde que cheguei à Bélgica sempre ouvi falar da existência de “obras-fantasma”, sobre as quais sentia uma enorme curiosidade, senti-me bafejada pela sorte quando descobri que o mesmo canal de televisão ia redifundir «Les bâtisseurs d'ans pires», vinte anos após a sua primeira emissão.
Porque desde que cheguei à Bélgica sempre ouvi falar da existência de “obras-fantasma”, sobre as quais sentia uma enorme curiosidade, senti-me bafejada pela sorte quando descobri que o mesmo canal de televisão ia redifundir «Les bâtisseurs d'ans pires», vinte anos após a sua primeira emissão.
Naquela reportagem, o jornalista belga apresentou ao país uma série de obras feitas durante os anos 60 e 70, altura em que a Bélgica era um dos países mais ricos do mundo, com os cofres cheios de dinheiro que urgia distribuir. Grande parte desse dinheiro serviu então para pagar a construção de obras públicas. Graças a isso, a Bélgica possui hoje uma densa rede de 29 auto-estradas (1700 kms), quase todas iluminadas (150 mil postes de iluminação) e sem portagens (mas tendo cada viatura de matrícula belga de pagar, anualmente, uma taxa de circulação). À data da reportagem, a Bélgica era ainda possuidora de 5200 pontes que, se fossem unidas, davam para atravessar o país de uma ponta a outra.
Para além das normais obras necessárias, contudo, foram gastos dezenas de biliões de francos belgas em obras que, pelo menos até 1986, não tinham qualquer utilidade. E foi disso que a reportagem tratou, mostrando pontes, viadutos, túneis e até aeroportos, inacabados ou prontos a utilizar, mas sem qualquer uso. Era o resultado da (des)articulação de um sistema político em que governos federais, regionais e locais não se entendiam, mas também de muita corrupção.
Outras grandes obras inúteis na Bélgica para além das inúmeras pontes e viadutos são, segundo a Wikipédia, 5 quilómetros de túnel de metro em Antuérpia, outros tantos quilómetros de túnel de metro em Charleroi e 2,5 quilómetros de túnel de metro em Liège.
15 Comments:
Ces belges sont fous!
Eu também ficava maluca se tivesse tanto dinheiro para gastar... :))
A mim dava-me mais jeito que o Sócrates montasse Portugal ao lado do aeroporto sem uso. Assim não precisava de ir sempre de avião para aí. :)
Beijola e bom fim de semana Laura!
Este tema é realmente fascinante e o título: "Les bâtisseurs d'ans pires" um achado.;-)
Não se pode transladar algumas dessa auto-estradas e túneis sem utilização para o interior de Portugal? Era capaz de dar jeito!;-)
Beijos
E sabem onde 'eles' vão buscar o dinheiro, não sabem?...
Se não tiverem ideia, passem então no "Postais de BXL" - o meu ultimo post dar-vos-á uma pequena-pequenina amostra ... :((
(cof-cof :) ... Carlota, perdão por esta desavergonhada publicidade ao blog alheio!)
;)
Sem dúvida esclarecedor, carlota como se costuma dizer dinheiro parado não rende, por isso é que nos continuamos na cauda da Europa.
bom dia*
Haja dinheiro e tudo se faz... Até obras inúteis!:)
Beijinhos e bom fim-de-semana!
Nos tempos "de vacas gordas" todos os países fizeram e fazem, obras públicas inúteis. Em escala muito mais pequena, que na Bélgica, conheço pelo interior de Portugal, autênticas aberrações nas estradas portuguesas.
Enfim, chamo a isso, a corrupção no seu pior!
Um abraço e bom fim de semana.
O pior é que este país já não nada em dinheiro - pelo contrário, tem uma dívida externa que precisa resolver e um endividamento público de quase 100%!
Será por isso que carregam tanto nos impostos????... */>*
O Armando roubou-me o post!!!! loool
:((((
Curioso... Não deixo de estabelecer o paralelismo, e pensar que se fossem fazer um repto às obras inúteis de Portugal, não tínhamos uma enciclopédia, mas uma colecção infindável de livros com inúmeras páginas... =P
Um beijinho grande de bom fim-de-semana*
Pelos vistos, as obras-fantasma são um mal comum.
Beijinhos
Por cá, embora talvez em menos escala, também se têm feito umas "asneiritas", com a diferença de que não tínhamos nem temos dinheiro para nos darmos a esses "luxos"...
Bjs e bom fim-de-semana!
não é só por cá, que acontecem as "obras inacabadas"
:)
Infelizmente, o betão, o cimento e o tijolo, dão dinheiro a ganhar a muitos e da forma menos clara. Depois, aparecem coisas destas. Inúteis para a generalidade das pessoas. Mas talvez bem úteis para alguns bolsos envolvidos. :(
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