domingo, novembro 11, 2007

Série comentários postados


A propósito do que escreveu o Carlos, sobre os vícios que não se perdem, lembrei-me daquelas características entranhadas no povo português, daquelas mesmo entranhadas! Sabem do que estou a falar, sabem?... Daquelas coisas mesmo, mesmo, mesmo, epá... entranhadas! Aquelas coisas tão entranhadas que quando nos referimos a elas dizemos, epá, estas coisas estão mesmo entranhadas! Daquelas coisas entranhadas que queremos arrancá-las e não conseguimos porque estão mesmo, mesmo entranhadas, as marotas! Sabem?... (*)

Uma das provas da existência histórica destas coisas mesmo, mesmo entranhadas, encontrei-a numa colectânea de textos de Eça de Queiróz e Ramalho Ortigão, "As Farpas". O excerto do texto que a seguir transcrevo foi publicado há 136 anos, mas o que me aflige é que podia tê-lo sido ontem. Se as coisas (não) evoluem assim, começo a achar que acreditar em mudanças de mentalidade é ainda mais ingénuo do que , sei lá, acreditar que pode haver um fim no conflito israelo-árabe...

O país perdeu a inteligência e a consciência moral. Os costumes estão dissolvidos, as consciências em debandada, os caracteres corrompidos. A prática da vida tem por única direcção a conveniência. Não há princípio que não seja desmentido. Não há instituição que não seja escarnecida. Ninguém se respeita. Não há nenhuma solidariedade entre os cidadãos. Ninguém crê na honestidade dos homens públicos. Alguns agiotas felizes exploram. A classe média abate-se progressivamente na imbecilidade e na inércia. O povo está na miséria. Os serviços públicos são abandonados a uma rotina dormente. O desprezo pelas ideias aumenta em cada dia. Vivemos todos ao acaso. Perfeita, absoluta indiferença de cima a baixo! Toda a vida espiritual, intelectual, parada. O tédio invadiu todas as almas. A mocidade arrasta-se envelhecida das mesas das secretárias para as mesas dos cafés. A ruína económica, cresce, cresce, cresce. As quebras(**) sucedem-se. O pequeno comércio definha. A indústria enfraquece. A sorte dos operários é lamentável. O salário diminui. A renda também diminui. O Estado é considerado na sua acção fiscal como um ladrão e tratado como um inimigo.



(*) Copyright Gato Fedorento
(**) Falências

9 Comments:

Blogger Sinapse said...

O Eça, o grande Eça!

novembro 12, 2007 12:41 da manhã  
Blogger Sinapse said...

Também já dizia o Eça que o governo não cai, porque não é um edifício; sairá com benzina, porque é uma nódoa!

E dizia também que ordinariamente todos os ministros são inteligentes, escrevem bem, discursam com cortesia e pura dicção, vão a faustosas inaugurações, são excelentes convivas. Porém, são nulos a resolver crises. Não têm a austeridade nem a concepção, nem o instinto político, nem a experiência que faz o estadista. É assim que há muito tempo em Portugal são regidos os destinos políticos. Política de acaso, política de compadrio, política de expediente. País governado ao acaso, governado por vaidades e por interesses, por especulação e corrupção, por privilégio e influência de camarilha, será possível conservar a sua independência?

;D

;D

novembro 12, 2007 12:49 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

Sinceramente não sei se vale a pena lembrarmo-nos destas coisas... pelo simples facto de que custam.

"Se as coisas (não) evoluem assim, começo a achar que acreditar em mudanças de mentalidade é ainda mais ingénuo do que , sei lá, acreditar que pode haver um fim no conflito israelo-árabe..."

E esta é a pior das verdades...


Às vezes preferia ser lerda e burra e viver no campo, lá nos confins, e não ter noção do mundo. Eh! eh!

;)

novembro 12, 2007 1:46 da manhã  
Blogger Carlota said...

:), Sinapse!

Então não vale a pena, Claudette?... Claro que sim! Foi o que fizeram os autores a que me refiro e olha quão bem se fala deles, mais de um século depois do que escreveram!
(E eu, aqui que ninguém nos ouve, às vezes também preferia viver nas couves...)

Beijolas às duas.

novembro 12, 2007 9:10 da manhã  
Blogger LeonorBarros said...

Espreita aqui: http://geracao-rasca.blogspot.com/2007/01/descubra-as-diferenas.html#links :-)

novembro 12, 2007 11:05 da manhã  
Blogger wednesday said...

De facto é incrível como os textos que comentacam e criticavam a sociedade da altura continuam, infelizmente, actuais. Custa, mas é o que os nossos governantes pelos vistos querem para o nosso país.

novembro 12, 2007 11:07 da manhã  
Blogger Carlota said...

Ups, Leonor!... Cheguei a pensar ir antes ao Google fazer uma pequena busca, mas acabei por esquecer-me...
(Tens imenso olho para a postagem, hein?...)
;))

De uma actualidade assustadora, Wed! :S

Beijolas às duas.

novembro 12, 2007 11:36 da manhã  
Blogger Leonor said...

Ora, já foi há tanto tempo... ainda "levei nas orelhas" subtilmente porque Camilo é melhor que Eça ;-)

novembro 12, 2007 12:04 da tarde  
Blogger AnaD said...

Bolas ... assustador como mais de um seculo volvido continuamos na mesma ... pronto vou ter pesadelos esta noite

novembro 12, 2007 10:50 da tarde  

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