Por Ricardo Araújo Pereira, na revista Visão
Quase não vejo televisão. O facto de fazer televisão não me obriga, graças a Deus, a vê-la – caso contrário, creio que já teria deixado esta vida. Mas sempre há coisas que vou gostando de ver. Os jogos do Benfica, por exemplo. É por isso que tenho TV Cabo (passe a publicidade) e Sport TV. Contudo, no princípio da semana passada, a TV Cabo (passe a publicidade) cortou-me a Sport TV. Não por falta de pagamento, mas porque era necessário trocar o aparelho que me permitia ver o canal por outro mais moderno, para que eu pudesse ver o canal mais modernamente. E, além disso, ter acesso a um pacote de canais chamado Funtastic Life. Posso dizer-vos que, curiosamente, a minha vida começou a ficar mais fantástica e divertida nesse mesmo dia.
Primeiro, é o cliente que tem de ir buscar o aparelho às instalações da TV Cabo (passe a publicidade). No meu caso, bastou esperar duas horas fantásticas para me darem a nova caixa fantástica. Depois, já em casa, montei a caixa mas, logo no primeiro passo da instalação, houve uma falha técnica (suponho que também fantástica, embora isso não fosse referido). O aparelho não era capaz de reconhecer a zona em que eu moro (o que só lhe fica bem, porque a vizinhança não é, de facto, particularmente interessante) e mandava-me ligar para um número. Liguei e, depois de uma espera de dez minutos, disseram-me que o número não era aquele, mas outro. Máquina e homem discordavam relativamente ao número correcto. Por puro chauvinismo, liguei para o número indicado pelo homem e pediram-me para aguardar. Aguarda-se muito, quando se está ao telefone com os funcionários da TV Cabo (passe a publicidade). Os funcionários são simpáticos, e eu até aguardo com prazer, mas sinto que se aguarda um pouco em demasia. Ao longo dos últimos dias, terei ligado umas dez ou quinze vezes, conheci funcionários de vários géneros e nacionalidades – mas o que fiz mais foi aguardar. O funcionárioque me atendeu – o primeiro de uma longa linhagem – começou por me pedir que fornecesse o número de cliente. Forneci. Que fornecesse os meus dados pessoais. Forneci também. Que fornecesse o número de identificação fiscal. Tornei a fornecer. Escuso de dizer que, entre cada fornecimento, há períodos em que é necessário aguardar. Vai-se fornecendo e aguardando, aguardando e fornecendo, até que a acumulação de dados fornecidos torna possível que se deixe de aguardar, porque o funcionário consegue, finalmente, encontrar o nosso contrato. Às vezes, o contrato só se deixa encontrar depois de terem sido fornecidas várias dezenas de dados. Em certa ocasião, quando o funcionário deu com a minha ficha, já eu me preparava para encher um frasquinho com urina, que iria em seguida fornecer à sede da TV Cabo (passe a publicidade).
Depois de encontrado o contrato, o funcionário chega normalmente à conclusão de que estamos em presença de uma falha técnica, por causa da qual se torna inevitável – adivinharam – aguardar. Normalmente, pedem que se aguarde quatro horas, findas as quais é suposto que o problema esteja resolvido. Até agora, esta última parte ainda não aconteceu. Já aguardei até ao final de város blocos de quatro horas e, ontem, cheguei a aguardar por um técnico, que também acabou por não aparecer. Normalmente, o problema são, ao que me dizem, “falhas”. Mas estaria a exagerar se dissesse que todos os serviços da TV Cabo (passe a publicidade) falham. O departamento que debita a mensalidade na minha conta, ao fim destes anos todos, nunca falhou.
Portanto (e embora eu esteja,neste preciso momento, a aguardar), uma semana depois de me terem cortado o serviço pelo qual eu continuo a pagar, ainda não tenho o canal que transmitiu o Benfica-Sporting. E ninguém me tira da cabeça que foi por causa disso que perdemos. Aliás, eu só sei que perdemos porque fui ver o jogo ao estádio. E os meus amigos que têm TV Cabo (passe a publicidade) também viram o jogo em condições e confirmam: perdemos mesmo.